Tuesday, August 5, 2008


aos poucos,
só,
de pedaços,

em estilhaços

o sol reflecte a luz que depois se inclina sobre mim
desenha um sorriso que não o meu,
sobre o rosto
a inexpressão de um dia anterior

só aos soluços,
sem nada de especial
só como tantos outros,
igual pelo amanhecer
entardecer
anoitecer

só nas horas vagas de dias insipidos,
ordeiros de uma rotina
infeliz o sentir de um abraço enjaulado
só respirando pelo espaço entre as grades
e querer escolher,
sobreviver só

um processo continuo de reclusão
aos poucos
de pedaços
só,
em estilhaços...

gritar com toda a profundida da garganta
arranhar o céu da boca
irritar as cordas vocais
agarrar a fala
só.

Monday, August 4, 2008

eco II

eu escrevo-te.
nao te reconheces nas palavras?
talvez não consigas ver por uma simples razão: todas as palavras são tuas.
quando escrevo, vejo-te, sinto-te, estás junto a mim, onde sempre estiveste, mesmo antes de te conhecer, e de onde nunca saíste.

pode parecer egoísta, mas escrevo para que as palavras sigam o seu curso e invariavelmente ele segue-te e é egoísta sim querer encerrar-te numa mera pagina de aglomerados verbais ou gramaticais. mas é assim que te posso ter mais perto, quando o espaço não nos permite respirar o ar um do outro...

escrevo-te.
sem entrelinhas, como eu gosto.

todas as minhas palavras nascem de ti.
só tu não as escutas ou lês...

elas gritam por ti.

escrevo-te.

eco

queria poder dizer-te o que sinto
queria falar mais e escrever menos...
não o sei fazer, por palavras meias...
deixo-me estender ao longo das linhas
na ilusão de que quanto maior for o número de linhas percorridas,
mais chego a algum lado, com palavras...
por vezes nem por isso,
apenas me embrulho, reembrulho e desato numa extensa embrulhada,
sem pensamentos fluídos ou com sentido...
algumas vezes nem sei muito bem onde quero chegar com as palavras,
junto-as, baralho-as, atiro depois à pagina e vejo no que resulta,
se num discorrer insensato de desarranjo verbal incontrolável
se numa ausência de fala
se num simples silêncio, em que a palavra está mas não diz...

queria poder dizer-te que sinto falta de mim nas tuas palavras
queria poder reconhecer-me,
como de certo te reconheces nas minhas,
nao quero, não posso querer, é injusto...
gostava que sim, que fosse verdade que o meu eco em ti fosse como o teu em mim
contínuo...

por vezes se o meu cérebro não fosse tão complicado, talvez fosse mais simples
suportar o caminho das linhas não escritas sem voz em mim
ou talvez não,
pela complexidade que uma palavra encerra ainda que na sua virtual ausência.

discorro linha a linha sem saber muito bem onde esta verborreia me conduz...

talvez fosse simples:
queria ler-me nas tuas palavras.